segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Energia: seis perguntas e respostas sobre os riscos para Portugal do conflito entre Rússia e Ucrânia | EXPRESSO - Miguel Prado

Foto: Nordstream 2 ECONOMIA Energia: seis perguntas e respostas sobre os riscos para Portugal do conflito entre Rússia e Ucrânia A incerteza é a mãe da volatilidade dos preços dos produtos energéticos e, com a crise na Ucrânia por resolver, há riscos na gestão que a Europa faz do seu aprovisionamento de gás. Lançamos meia dúzia de perguntas e respostas sobre o tema Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on LinkedInEmail this to someone 13:01 7 Fevereiro, 2022 | Miguel Prado Com muita incerteza no horizonte quanto a um conflito armado no Leste da Europa, persistem dúvidas sobre a capacidade do Velho Continente de se aprovisionar de gás, caso a Rússia feche as torneiras. Mas nas últimas semanas o aprovisionamento russo tem sido menor, e a Europa vai conseguindo, com mais gás dos Estados Unidos, satisfazer as suas necessidades. E Portugal? Importa gás russo? Corre algum tipo de risco? Um conflito entre a Rússia e a Ucrânia ameaça o abastecimento de energia da Europa? Um conflito entre os dois países poderá introduzir limitações no abastecimento de gás natural, sobretudo se a Rússia decidir suspender o trânsito de gás para a Ucrânia, que é a via de passagem deste combustível para a Alemanha. “Creio que mesmo num cenário de um ataque menos severo da Rússia à Ucrânia os russos muito provavelmente cortarão o trânsito de gás para a Ucrânia, rumo à Alemanha”, comentou, citado pela agência AP, Dan Fried, um antigo diplomata norte-americano, que em 2014 esteve envolvido nas sanções que os Estados Unidos aplicaram à Rússia após a invasão da Crimeia. Mas mesmo que tal aconteça, a Europa terá algumas opções para não ficar descoberta. Quais as fontes europeias de aprovisionamento de gás? A Rússia é, efetivamente, o maior fornecedor de gás natural à Europa. Em 2019 chegou a representar mais de 40% do aprovisionamento de gás da Europa. Mas neste início de 2022 o peso da Rússia é menor. Dados da associação europeia de transporte de gás analisados pelo instituto Bruegel indicam que na quarta semana do ano (final de janeiro) a Europa recebeu 1,8 mil milhões de metros cúbicos (BCM) de gás natural da Rússia, ou seja, um pouco mais de 20% dos 8,9 BCM importados semanalmente pela União Europeia. A Noruega, fornecendo 2,8 BCM por semana, é outro fornecedor de referência, e a Argélia, com 0,7 BCM, também. Mas a principal fonte de aprovisionamento hoje, com quase 3,5 BCM, é o gás natural liquefeito (GNL) importado por navio, sendo os Estados Unidos da América (EUA) um dos principais fornecedores. A estas fontes atuais poderá somar-se uma outra via de abastecimento, o gasoduto Nord Stream 2, que liga diretamente, pelo mar, a Rússia à Alemanha. Mas a efetiva entrada em operação desta infraestrutura, já construída, tem sido adiada. O Nord Stream 2 acrescentará uma capacidade superior a 1 BCM por semana. Portugal pode sofrer algum tipo de consequência? Um corte no abastecimento de gás russo, mesmo que parcial, causaria sempre alguma pressão sobre a Europa, obrigando o Velho Continente a reforçar o aprovisionamento por outras fontes, designadamente por via do gás liquefeito. Isso poderá de algum modo influenciar o trânsito de navios metaneiros. Mas a exposição de Portugal ao gás russo é relativamente limitada. A principal consequência é que sendo o gás uma matéria-prima cujo preço é fixado internacionalmente e muito volátil, um eventual corte no fornecimento via Ucrânia poderia voltar a agravar a cotação do gás, obrigando a generalidade dos países europeus, Portugal incluído, a pagar mais por este recurso energético (e também a incorrer em maiores custos de geração de eletricidade, já que as centrais de ciclo combinado são alimentadas a gás). Como é que Portugal faz o seu aprovisionamento de gás? Portugal tem duas vias de importação de gás natural. Uma é por via terrestre, através dos gasodutos que ligam Campo Maior a Badajoz e Valença do Minho a Tuy. A outra é o terminal de GNL que a REN opera em Sines, e que tem assumido crescente importância. Nesse terminal todas as semanas descarregam um a dois navios metaneiros. Em 2021, segundo dados da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), Portugal importou da Rússia 572 milhões de metros cúbicos (0,7 BCM) de gás, ou seja, 10,2% das nossas importações. A Nigéria (49,5%) e os Estados Unidos (33,3%) foram os nossos maiores fornecedores. Todavia, em novembro e dezembro Portugal nada importou de gás russo e em janeiro de 2022, de acordo com a REN – Redes Energéticas Nacionais, também não: no primeiro mês do ano 60,2% do gás que entrou no país veio da Nigéria, 29,1% da Nigéria e 13,2% de Trinidade e Tobago. E petróleo? A Rússia era um dos fornecedores de petróleo de Portugal, mas em 2020, último ano com dados detalhados pela DGEG, o nosso país não importou petróleo russo (os nossos maiores fornecedores foram, por esta ordem, Brasil, Nigéria, Arábia Saudita e Angola). Em 2019 importámos 1,2 milhões de toneladas de petróleo da Rússia (10,6% das nossas importações petrolíferas), depois de em 2018 termos importado 2,47 milhões de toneladas (19,6%). Os preços do gás ainda podem subir mais? Tal como o crude, o gás natural apresenta elevada volatilidade em termos de preço. A oscilação de preços foi particularmente visível no final de 2021, com a Europa a aumentar as suas necessidades de aprovisionamento de gás para o inverno, ao mesmo tempo que algumas economias asiáticas faziam o mesmo, criando uma forte pressão inflacionista nos preços de vários contratos de gás. O contrato TTF (Title Transfer Facility), uma referência para a Europa, chegou aos 166 euros por megawatt hora (MWh) a 21 de dezembro (e isso refletiu-se também em Portugal e Espanha, que atingiram um máximo histórico no preço grossista da eletricidade de 383,67 euros por MWh a 23 de dezembro). Mas desde então o preço do gás caiu para metade. Na sexta-feira o TTF era transacionado em torno dos 82 euros por MWh. Embora longe do seu pico de dezembro, é ainda um preço relativamente elevado (basta ver que até março de 2021 este contrato valia menos de 20 dólares). Na semana passada, a notícia de que a Rússia estava a reforçar o fornecimento de gás à Eslováquia por um gasoduto que atravessa a Ucrânia provocou uma descida de 10% na cotação do TTF. Movimentos inversos, de eventuais cortes no aprovisionamento, podem levar, simetricamente, a agravamentos de preços, embora seja difícil prever para que nível, pois isso dependerá muito dos volumes suspensos e da existência, ou não, de flexibilidade na oferta global de gás para suprir as necessidades da Europa. Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on LinkedInEmail this to someone Energia: seis perguntas e respostas sobre os riscos para Portugal do conflito entre Rússia e Ucrânia A incerteza é a mãe da volatilidade dos preços dos produtos energéticos e, com a crise na Ucrânia por resolver, há riscos na gestão que a Europa faz do seu aprovisionamento de gás. Lançamos meia dúzia de perguntas e respostas sobre o tema Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on LinkedInEmail this to someone 13:01 7 Fevereiro, 2022 | Miguel Prado Com muita incerteza no horizonte quanto a um conflito armado no Leste da Europa, persistem dúvidas sobre a capacidade do Velho Continente de se aprovisionar de gás, caso a Rússia feche as torneiras. Mas nas últimas semanas o aprovisionamento russo tem sido menor, e a Europa vai conseguindo, com mais gás dos Estados Unidos, satisfazer as suas necessidades. E Portugal? Importa gás russo? Corre algum tipo de risco? Um conflito entre a Rússia e a Ucrânia ameaça o abastecimento de energia da Europa? Um conflito entre os dois países poderá introduzir limitações no abastecimento de gás natural, sobretudo se a Rússia decidir suspender o trânsito de gás para a Ucrânia, que é a via de passagem deste combustível para a Alemanha. “Creio que mesmo num cenário de um ataque menos severo da Rússia à Ucrânia os russos muito provavelmente cortarão o trânsito de gás para a Ucrânia, rumo à Alemanha”, comentou, citado pela agência AP, Dan Fried, um antigo diplomata norte-americano, que em 2014 esteve envolvido nas sanções que os Estados Unidos aplicaram à Rússia após a invasão da Crimeia. Mas mesmo que tal aconteça, a Europa terá algumas opções para não ficar descoberta. Quais as fontes europeias de aprovisionamento de gás? A Rússia é, efetivamente, o maior fornecedor de gás natural à Europa. Em 2019 chegou a representar mais de 40% do aprovisionamento de gás da Europa. Mas neste início de 2022 o peso da Rússia é menor. Dados da associação europeia de transporte de gás analisados pelo instituto Bruegel indicam que na quarta semana do ano (final de janeiro) a Europa recebeu 1,8 mil milhões de metros cúbicos (BCM) de gás natural da Rússia, ou seja, um pouco mais de 20% dos 8,9 BCM importados semanalmente pela União Europeia. A Noruega, fornecendo 2,8 BCM por semana, é outro fornecedor de referência, e a Argélia, com 0,7 BCM, também. Mas a principal fonte de aprovisionamento hoje, com quase 3,5 BCM, é o gás natural liquefeito (GNL) importado por navio, sendo os Estados Unidos da América (EUA) um dos principais fornecedores. A estas fontes atuais poderá somar-se uma outra via de abastecimento, o gasoduto Nord Stream 2, que liga diretamente, pelo mar, a Rússia à Alemanha. Mas a efetiva entrada em operação desta infraestrutura, já construída, tem sido adiada. O Nord Stream 2 acrescentará uma capacidade superior a 1 BCM por semana. Portugal pode sofrer algum tipo de consequência? Um corte no abastecimento de gás russo, mesmo que parcial, causaria sempre alguma pressão sobre a Europa, obrigando o Velho Continente a reforçar o aprovisionamento por outras fontes, designadamente por via do gás liquefeito. Isso poderá de algum modo influenciar o trânsito de navios metaneiros. Mas a exposição de Portugal ao gás russo é relativamente limitada. A principal consequência é que sendo o gás uma matéria-prima cujo preço é fixado internacionalmente e muito volátil, um eventual corte no fornecimento via Ucrânia poderia voltar a agravar a cotação do gás, obrigando a generalidade dos países europeus, Portugal incluído, a pagar mais por este recurso energético (e também a incorrer em maiores custos de geração de eletricidade, já que as centrais de ciclo combinado são alimentadas a gás). Como é que Portugal faz o seu aprovisionamento de gás? Portugal tem duas vias de importação de gás natural. Uma é por via terrestre, através dos gasodutos que ligam Campo Maior a Badajoz e Valença do Minho a Tuy. A outra é o terminal de GNL que a REN opera em Sines, e que tem assumido crescente importância. Nesse terminal todas as semanas descarregam um a dois navios metaneiros. Em 2021, segundo dados da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), Portugal importou da Rússia 572 milhões de metros cúbicos (0,7 BCM) de gás, ou seja, 10,2% das nossas importações. A Nigéria (49,5%) e os Estados Unidos (33,3%) foram os nossos maiores fornecedores. Todavia, em novembro e dezembro Portugal nada importou de gás russo e em janeiro de 2022, de acordo com a REN – Redes Energéticas Nacionais, também não: no primeiro mês do ano 60,2% do gás que entrou no país veio da Nigéria, 29,1% da Nigéria e 13,2% de Trinidade e Tobago. E petróleo? A Rússia era um dos fornecedores de petróleo de Portugal, mas em 2020, último ano com dados detalhados pela DGEG, o nosso país não importou petróleo russo (os nossos maiores fornecedores foram, por esta ordem, Brasil, Nigéria, Arábia Saudita e Angola). Em 2019 importámos 1,2 milhões de toneladas de petróleo da Rússia (10,6% das nossas importações petrolíferas), depois de em 2018 termos importado 2,47 milhões de toneladas (19,6%). Os preços do gás ainda podem subir mais? Tal como o crude, o gás natural apresenta elevada volatilidade em termos de preço. A oscilação de preços foi particularmente visível no final de 2021, com a Europa a aumentar as suas necessidades de aprovisionamento de gás para o inverno, ao mesmo tempo que algumas economias asiáticas faziam o mesmo, criando uma forte pressão inflacionista nos preços de vários contratos de gás. O contrato TTF (Title Transfer Facility), uma referência para a Europa, chegou aos 166 euros por megawatt hora (MWh) a 21 de dezembro (e isso refletiu-se também em Portugal e Espanha, que atingiram um máximo histórico no preço grossista da eletricidade de 383,67 euros por MWh a 23 de dezembro). Mas desde então o preço do gás caiu para metade. Na sexta-feira o TTF era transacionado em torno dos 82 euros por MWh. Embora longe do seu pico de dezembro, é ainda um preço relativamente elevado (basta ver que até março de 2021 este contrato valia menos de 20 dólares). Na semana passada, a notícia de que a Rússia estava a reforçar o fornecimento de gás à Eslováquia por um gasoduto que atravessa a Ucrânia provocou uma descida de 10% na cotação do TTF. Movimentos inversos, de eventuais cortes no aprovisionamento, podem levar, simetricamente, a agravamentos de preços, embora seja difícil prever para que nível, pois isso dependerá muito dos volumes suspensos e da existência, ou não, de flexibilidade na oferta global de gás para suprir as necessidades da Europa. Share on FacebookTweet about this on TwitterShare on LinkedInEmail this to someone

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