Razão porque a Câmara Municipal do Porto não aceitou atribuir o nome de uma rua do Porto a José Saramago.
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PORTO Presidência
Câmara Municipal
Exma Senhora
Presidente do PEN. Clube Português
Campo Mártires da Pátria, 37
1169-016 LISBOA
Porto, 23-07-20-10
N/Ref.: I/100346/10/CMP
Assunto: Atribuição de topónimos na cidade do Porto
Acusamos a carta de V Exa. sobre o assunto em epígrafe, recebida ontem na Câmara do Porto, e de cujo teor já havíamos tornado conhecimento através da comunicação social. Apesar de não apreciarmos o método utilizado – de dar a carta a conhecer aos Jornais antes mesmo de esta chegar ao seu destinatário – entendemos que é nosso dever esclarecer o P. E. N. Clube Português sobre a pertinente questão que coloca.
Quando cheguei à Câmara do Porto existia uma Comissão de Toponímia constituída quase exclusivamente por Vereadores. Entendi então propor ao Executivo uma nova lógica e formar uma comissão apenas com personalidades de relevo na vida da cidade e oriundas das mais diversas sensibilidades políticas. Fi-lo na convicção de que a atribuição do nome de alguém a um qualquer espaço público deve ser não só fruto do conhecimento de quem mais sabe, como deve também representar o mais amplo consenso; justamente como forma de enaltecer e honrar tais personalidades.
A Comissão de Toponímia passou assim a actuar segundo critérios que os seus membros definiram, sendo de relevar, desde logo, que a sua opção dominante foi no sentido de apenas atribuir o nome de espaços públicos a personalidades já falecidas e que na sua vida tenham tido uma relação próxima e directa com a cidade. Sempre respeitamos esta opção, sendo certo que, politica e legalmente, até a podíamos contrariar.
É por esta razão que, quando verbalmente sugeri “dar” o nome de uma rua do Porto a cada um dos Presidentes da República do pós 25 de Abril, a ideia não colheu junto da nova Comissão de Toponímia.
É também por esta razão (e de isenção partidária) que sempre aceitei propor à comissão, e depois votar favoravelmente, o nome dos comunistas que o PCP propôs, e que, tendo falecido, estavam ligados ao Porto. Prática que, por exemplo, o Partido Comunista nem sempre utiliza quando estão em causa personalidades que não lhe são politicamente afectas, designadamente aquando da atribuição das Medalhas da Cidade. Percebe-se pela história desse partido, e de muitos dos seus militantes, que esse exercício de abertura e tolerância não lhe seja fácil.
A razão porque o Executivo entendeu não acolher a proposta do PCP, de atribuir o nome de uma rua do Porto a José Saramago, é pois esta, ou seja, a inexistência de uma relação directa com o Porto.
Mas deixe que também lhe confesse, com toda a transparência, que, se não existisse a regra aqui referida, a minha consciência teria muita dificuldade em votar favoravelmente o nome de José Saramago para uma rua do Porto. Porque o Porto é uma terra de liberdade. E, por isso, a sua idiossincrasia não é compaginável com posturas de contorno intolerante ou, por exemplo, com os saneamentos políticos de jornalistas que o ilustre escritor promoveu no "Verão Quente de 75" enquanto director-adjunto do DN.
Perceberá V.Exa. que, para quem dá grande valor aos princípios democráticos, é muito difícil ultrapassar atropelos tão graves à democracia, mesmo que em nome de um elevadíssimo mérito específico como é o caso do nosso Prémio Nobel da Literatura.
Com os melhores e mais respeitosos cumprimentos,
PS. Tendo V. Exas. dado nota pública da carta que nos enviaram, tomamos a liberdade de também o poder fazer, após a recepção desta resposta por parte de V. Exa.
É de compêndio a atitude tomada pela C.M.Porto!
ResponderEliminarAo enviar a resposta ao PEN Clube, aproveita para dar uma bofetada de luva branca.