domingo, 13 de março de 2022
AQUI KIEV - Fico até à vitória
Em baixo, uma zona residencial de Mariupol, de um dos lados da autoestrada, antes da guerra. Em cimaImagens de satélite mostram a destruição de prédios civis em Mariupol
João "Bacalhau" Pedro abraça o médico ucraniano Alexandre RodinA caminho da Ucrânia: Hoje fomos abraçados pelo Bem e o Bem chama-se Bacalhau
Parecem um exército fandango, não há duas fardas iguais, nada bate certo com nada, uns usam colete, outros não. Alguns tapam a cara com passa-montanhas, o mais "pintas" do bairro usa uns óculos escuros, armação azul, lentes azuladas, todos o gozam pela escolha do adereço.
Aparecem do nada em vários carros. Um deles, uma carrinha de matrícula da Estónia, tem um grafíti: "Glória à Ucrânia" escrito em cor de rosa. Outro dos carros de uma das inúmeras brigadas de defesa civil de Vyshhorod, cidade a dez quilómetros na direção nordeste da capital, é de uma loja de venda de eletrodomésticos. Um terceiro, acaba de ser resgatado da sucata e arrasta-se, barulhento, enferrujado, mas a andar.
A dúzia de homens voluntários para defenderem a zona residencial onde vivem não podia ser mais heterogénea. Neste caso, como em muitos lugares onde isso é possível, há um polícia que comanda esta linha de defesa. Ao contrário do que normalmente acontece nos postos de controlo, dentro e nos acessos à capital, o grupo está divertido, descontraído, ri alto e troca piadas entre si. Não só se deixam fotografar, como agradecem a fotografia. Fazem pose. Não muito longe, ouvem-se disparos. "No problema".
DEFESA CIVIL
O som é da defesa antiaérea ucraniana, portanto está tudo controlado. "São apenas pessoas normais", explica Andrii, de 40 anos, que já tem o uniforme do exército, completo, impecável. Explica-nos que se alistou, mas o exército disse que ainda não precisava dele. Quer ir para as patrulhas de defesa civil, mas ainda não tem arma. Por isso, é voluntário, ajuda como pode, mas está desejoso de entrar na defesa civil, a "segunda linha", de proteção. Nunca disparou uma arma, teve algum treino há 20 anos, mas diz estar pronto para o fazer. Na fila de espera para a defesa civil está também, Irina, uma mulher de 44 anos, colega de Andrii. Mesmo sem uniforme, comporta-se naturalmente como um sargento. Dá ordens, põe a máquina a funcionar, conhece cada palmo da zona onde vive. Nos primeiros dias de guerra, há duas semanas, chocou com o carro contra um check point. O exército arranjou-lhe outro. "Ira" não podia estar parada, é demasiado valiosa para a operação da resistência civil ucraniana. Quando chegarem as credenciais que já pediu, estará também ela nos postos de controlo, na patrulha, na defesa armada do território.
"Um a um, disparo sobre eles um a um". Eles são os russos, ela uma ucraniana decidida a não desistir. Parece uma padeira de Aljubarrota de Vyshhorod.
À ESPERA DE UM ATAQUE
Anna é a mais reservada do grupo dos três que trabalham numa produtora de filmes. Fala pouco, está mal vestida para a tarefa, mal agasalhada, treme de frio, "hoje estava a contar ficar em casa, mas tive de vir", os três acabam de deixar medicamentos e material médico no hospital da cidade. Recolhem bens de todo o género e levam-nos onde fazem falta. Tem 21 anos, estuda cinema, Kiev está à espera de um ataque, muitos consideram deixar a capital, e ela, vai embora, entretanto? Responde de imediato, "não", não vai a lugar nenhum, ficará na cidade, "até à nossa vitória".
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