domingo, 13 de março de 2022

GUERRA NA UCRÂNIA Como se sai de um cerco? Não se sai: “Kiev é uma batalha perdida, as pessoas vão ter de escolher entre a morte e uma paz negociada”

Expresso GUERRA NA UCRÂNIA Como se sai de um cerco? Não se sai: “Kiev é uma batalha perdida, as pessoas vão ter de escolher entre a morte e uma paz negociada” Zurab Kurtsikidze Não é a primeira vez que a capital da Ucrânia é cercada pelo inimigo. E, tal como em 1941, a diferença entre forças é de tal ordem que a cidade irá certamente tombar para o lado do invasor, diz o major-general Vieira Borges. Porque “os russos não vão parar” 13 MARÇO 2022 16:12 Rui Gustavo Jornalista Já houve uma altura em que russos e ucranianos lutaram lado a lado para defender Kiev. E perderam. Em 1941, ainda no início da Operação Barbarossa e da invasão da então União Soviética pela Alemanha nazi, as tropas alemãs montaram o maior cerco da história militar à capital da Ucrânia. “Eram 25 divisões mecanizadas e nove blindadas. Cerca de 600 mil homens”, explica o major-general Vieira Borges, professor de Estratégia Militar e Relações Internacionais. “Era uma guerra mundial, ambas as partes tinham apoios de outros países. A dimensão do que aconteceu não tem comparação com o que está a acontecer agora”, sublinha. Na altura, 660 mil pessoas morreram no cerco a Kiev. Na maioria, soldados russos. “Os alemães começaram por bombardear a cidade com aviação e artilharia até destruírem tudo e depois entraram. Mesmo assim, sofreram baixas pesadas e perderam 30 mil homens no combate casa a casa”, explica o professor. O cerco demorou cerca de um mês e foi umas das maiores derrotas da história do exército vermelho que mesmo assim conseguiu atrasar as tropas nazis o suficiente até à intervenção do implacável general inverno que travou o invasor no caminho para Moscovo. Hoje, no 18.º dia da Guerra na Ucrânia, ou da Operação Militar Especial - como os russos batizaram a invasão do país vizinho-, há uma coluna militar com 60 quilómetros de extensão que se aproxima da capital da Ucrânia e estará agora a cerca de vinte quilómetros de distância. É o cerco que se aproxima? “Sim, a tomada da capital e o hastear da bandeira no palácio do inimigo faz parte da estratégia do ocupante. É sempre assim e foi sempre assim. Durante a II Guerra Mundial, ou recentemente, em Alepo”, conta o major-general. “Os russos não vão ocupar a Ucrânia toda. Isso é impossível, estamos a falar do segundo maior país da Europa, maior do que a Alemanha ou a França. O objetivo deles é tomar o poder, desmantelar o exército e para isso têm de tomar a capital. Não vão parar. Primeiro tomam as cidades vizinhas, como já estão a fazer para dar o exemplo, e depois é a capital, que é sempre a última cidade a tomar”. E um cerco hoje, afinal, não é assim tão diferente dos de há oitenta anos. “Não sabemos ao certo quantos homens estão nessa coluna que se aproxima, vinte mil, trinta mil. Grande parte dessa coluna é constituída por logística. Os homens têm de ser alimentados e rendidos. Não vão viver da terra. A estratégia passa por cortar as fontes de abastecimento de água e energia, destruir os símbolos de poder e os edifícios públicos e forçar os sitiados à rendição. Se isso não acontecer, destroem a cidade com artilharia e depois entram.” Tal como em 1941. “Mais uma vez, não se pode comprar a dimensão das forças nem do conflito. Mas Kiev é uma batalha perdida para os defensores. É uma questão de tempo. Os russos vão ganhar a guerra mas perder a paz”, conclui o professor. “As pessoas vão ter de escolher entre a morte e paz negociada. É triste dizer isto, mas é a verdade. A desproporção de forças é demasiado grande”. E não há solução. “Só se a China intervier. Nós sabemos quem é o país invasor e o invadido. O destruidor e o destruído. Mas este é o momento da paz, como disse António Guterres, e só depois da negociação. Mas várias linhas vermelhas foram ultrapassadas. Primeiro foi a Rússia E depois? A China, os Estados Unidos? Não podemos viver em paz assim.” + Exclusivos

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