quarta-feira, 18 de setembro de 2013
Texto de António Pinho Vargas
MOVIMENTO IGUALDADE - Todos diferentes,
todos iguais
António Pinho Vargas (Publicado na página pessoal do Facebook, 16 Setembro 2013)
Não são precisas muitas palavras. Até 1974 tinha vergonha do meu país, mesmo só com 22 anos. Ele era objecto de manifestações em muitos países, era o regime de ditadura mais antigo da Europa e tinha ainda um império e uma guerra colonial. Durante quase 40 anos estivemos dobrados perante a ditadura, não esquecendo os que lutaram como puderam contra ela ao longo dos longos tempos de miséria, pobreza e extrema desigualdade. Mas foi o movimento militar a derrubar o regime. Honra para eles. Correr à frente da polícia de choque não era uma heroicidade. Eram aqueles tempos e muita gente, estudante ou sindical. Mas nós, os civis, não derrubámos o regime de Salazar. Foram os militares que o fizeram coisa aliás rara no mundo. O golpe assassino contra Allende, reeleito ainda com maior vantagem, tinha sido 7 meses antes. Era isso que acontecia normalmente, financiado por aqueles que depois se passaram a preocupar com os direitos humanos em certos sítios do mundo. Noutros não, o que revela a hipocrisia política do dito 'mundo livre' dessa altura. Do outro lado da guerra fria também não vinham boas notícias já há muito. Mas o nosso papel devia ter sido esse. Derrubar a ditadura. Honra ao MFA por isso. Aquele foi "o dia inicial inteiro e limpo" como diz o poema de Sophia. Hoje volto a ter vergonha, porque há gente medíocre e sem valores que tomou o poder com mentiras e pretende voltar à miséria e à desigualdade do antigamente com o orgulho e o cinismo dos bem nascidos. São os filhos e os netos dos antigos. Pertencem à mesma classe, partilham os mesmos valores e os mesmos requintes à mesa. Mas são muito incultos, muito arrogantes, fechados nos seus mundos pequenos e medíocres, nas suas jóias e nos seus carros de luxo e na sua profunda ignorância e na mediocridade de uma vida concentrada na ostentação e no dinheiro. Por mais que viajem para Bruxelas falta-lhes 'mundo', coisa que nem sabem o que é. Mas têm pouco mais para oferecer, apesar do garbo e dos fatos às riscas. Portugal já é o país mais desigual da Europa. Por isso só posso ter vergonha do meu país outra vez. Mas nasci aqui e vou morrer aqui. Viajei que me fartei mas já não tenho idade, nem vontade, nem força para emigrar. Nem quero sequer pensar nisso. As esquerdas, como antes, lutam sem grande eficácia e talvez sem encontrarem o tom discursivo adequado nas suas eternas divergências sem horizonte. Têm razão em muitas coisas mas não chega ter razão. Parecem tão impotentes como este texto ou qualquer outro. Aliás textos e análises é o que mais há e não me venham falar em tanques. Isso foi quando foi e mesmo assim demorou 40 anos a ser. Estamos cansados e cansados de estar cansados. Percebe-se talvez por que sinto que me devo calar como já disse há uns dias. A "justa fúria" cresce com mesma intensidade da impotência. Repetir as mesmas coisas torna-se inútil. Cresce o lado frágil do artista que começa a não gostar de arte porque nunca a viveu numa redoma. Chama-se porventura desencanto e não se vê um vislumbre de um novo reencantamento possível. Não poderei continuar muitas vezes a fustigar os amigos com coisas destas. Fazem-me mal a mim e aos outros. Peço desculpa. (Enfim, quem não quiser ler, que não leia por favor)
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